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Good Girls | Crítica - 2ª Temporada

Inevitável dizer que Good Girls, série original da Netflix, é uma grande salada de ideias, temas com variados tons. Esta é a parte onde é justo elogiar a criadora deste projeto, Jenna Bans. O que foi iniciado com a primeira temporada no ano passado, não apenas se manteve como resolveram pisar no acelerador em outras coisas (e vale lembrar que já foi renovada para uma terceira temporada ano que vem).

O fato de a história de três mães suburbanas que resolvem tomar o controle da ação e assaltam um supermercado na cidade de Detroit, no estado do Michigan, só aí, apenas com esta simples sinopse, abre-se um extenso leque de várias possibilidades. E, não tenha dúvida, os roteiristas desta série querem aproveitar todas elas. Isto é bom, mas também dá margem para algumas irregularidades.

A parte positiva disso é que nesta segunda temporada, já disponível para os assinantes da Netflix, a série de Bans consegue abordar temas, como o gosto pelo poder, e a sensação de independência que ele traz; o vício no trabalho e como isto afeta o lar; os acordos e a transigência necessárias para um casamento funcionar, e assim por diante.

Agora, o lado negativo disto é que algumas vezes, geralmente por uma dificuldade de afinação do tom utilizado, dá-se a impressão de tentativa de espremer até a última gota de suco de um determinado assunto ou tema, que acaba por ser banalizado. Ainda mais se há uma desigualdade de roteiro que foi apanhado em um zigue-zague que busca criar suspense, mas que se repetido algumas vezes, acaba virando um truque de fácil identificação.

A nova temporada de Good Girls fica se equilibrando entre estes dois lados. As vezes, muito inspirada e capaz de prender sua atenção total; em outras, maçante, já que circula muito quase todo o tempo, sem trazer elementos de surpresa (o fato de serem treze episódios não ajuda muito nesse caso). Se por um lado, o primeiro episódio desta segunda temporada têm um início mais vigoroso, os dois seguintes se mostraram um pouco mais cansados, para dar uma noção deste desnível que ocorre.

Conseguir encontrar o tom, vem muito na construção das ações, e como elas vão empilhando até um momento de quebra, de ruptura, seja pelo drama ou comédia, e na ordem de preferência. Em alguns momentos isto é bem executado, tornando o capítulo algo mais prazeroso, como acontece no nono episódio, por exemplo. Talvez o mais divertido de toda a temporada. Agora, a situação contrária acontece no episódio sete, onde a filha pequena de Beth esquece seu cobertor em uma situação que parecia bem desconfortável para a mesma, o que acaba não sendo uma verdade, pela completa falta de suspense.

Falando em veracidade, vale ressaltar que em Good Girls, que trata temas reais cotidianos, com personagens também na mesma linha, exige bastante do espectador que ele entre a bordo este trem de possibilidades e situações insanas que acontecem na vida destas três mulheres. E, quando se usa de tal insanidade, muitas vezes isto pode incomodar o assinante Netflix que almeja algo mais crível. Se este for o caso, melhor escolher outro programa, pois aqui, parece que tudo (!) conspira a favor de nossas anti-heroínas, o que inclui um bandidão do crime muito tolerante, e até compreensivo demais.

Nessa doideira toda, algo de muito agradável que Good Girls consegue fazer (principalmente através do humor) é providenciar as chances para quem assiste de mergulhar nessa espiral de mal a pior que acontece na vida das três, e olha, as coisas as vezes realmente se complicam para elas como no episódio onze. Nessa parte, é necessário dar alguns méritos para a trilha sonora da série da Netflix, eclética, mas que sempre busca um algo mais vibrante.

Outro aspecto de qualidade ocorrente nesta segunda temporada, é que ao menos em quatro dos personagens do elenco principal, existe uma evolução qualitativa. Para ser exato, isso ocorre com os casais: Beth e Dean; e Ruby e Stan.

Se com Beth, interpretada de maneira nuançada por Christina Hendricks, não consegue-se tirar tanto humor, não dá para dizer que falta construção dramática. A ascensão e satisfação pelo poder em Beth, é detalhada, e erguida aos poucos nesta temporada, meio que na ideia de quanto pior fica, mais natural ela se sente com suas ações, mesmo em alguns momentos de consciência que surgem, como no episódio dez (o mais fraco de todos). Chegando ao final desta temporada, fica claro que Beth precisa e sabe exatamente o que quer, mesmo que seja sobrecarregado do drama (até tragédia) que vem acoplado junto.

No caso de Dean, agora, é possível observar algumas mudanças nele, vide o trauma logo no episódio inicial. É como se, gradativamente, assim como acontece com Beth, analisamos uma diminuição de seu ego, que foi obliterado pela figura masculina de Rio, dando brecha para uma oportunidade de conscientização de quem é, o que fez e o que pode fazer por sua família.

Mas, o maior destaque desta temporada é para o casal Ruby e Stan, cada dia mais unidos, levando muito a sério os votos que se diz na cerimônia de casamento. Aqui, fica impossível separar os dois, na medida que quanto mais Ruby, que surpreende a si própria nos levando como cúmplice em suas audaciosas e mirabolantes empreitadas no mundo do crime, mais seu marido Stan, que merece o título de melhor e pior pai de família do mundo, se debruça e vira do avesso para salvar a pele de sua amada, colocando o mesmo no patamar antiético que se encontra Ruby.

Contribui muito esta evolução do último casal, a interpretação versátil de Retta, que vai bem na comédia, e melhor ainda no drama; e a naturalidade do personagem de Reno Wilson.

A conclusão derradeira é que Good Girls da Netflix tem o que dizer, e possui talentos de sobra para praticar isso. Basta saber canalizar melhor alguns de seus pontos que conseguirá com sucesso prender ainda mais a atenção do assinante. Na terceira temporada, teremos outra chance de ver isto funcionar. Mais corajosas, mais insanas, maior ganância, e um adendo: sem coleiras.

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