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Mostra SP | Crítica: Parasita

Foi dada a largada! Estamos no mês da 43ª Mostra Internacional de Cinema. E, dentre tantos títulos aguardados do festival, temos alguns de maior destaque. Um deles é Parasita – ganhador da Palma de Ouro em Cannes e pré-selecionado ao Oscar como representante da Coreia do Sul – de Bong Joon-ho, renomado autor de cinema sul-coreano responsável por obras como o assombroso O Hospedeiro, o lacerante Mother – A Busca pela Verdade e Okja, produção queridinha da Netflix.

Pelo nome, pode-se imaginar que seu mais novo longa-metragem seja um retorno às raízes, como em O Hospedeiro de 2006, um filme de monstro. De certa maneira, trata-se de um monstro, mas este não é uma criatura anfíbia grotesca emergida do rio, agora, lida-se com uma existência bem mais realista: nós, humanos.

A nova obra do cineasta Bong Joon-ho trata da família de Ki-woo que está toda desempregada, morando em um porão pequeno na parte mais pobre da cidade. Min-hyuk, amigo próximo de Ki-woo está se preparando para estudar no exterior, e antes de deixar o país, indica o amigo em necessidade para um trabalho como professor particular de inglês de uma jovem garota de família rica. O jovem vê uma oportunidade ali, e bola um plano para que todo o seu clã comece a trabalhar para a família Park. Porém, não imaginam os segredos que se escondem dentro da mansão Park, e o quanto serão afetados por estes.

O cinema sul-coreano é daquelas realidades que fica difícil tratar como apenas mais um movimento artístico qualquer. Em 2016, Invasão Zumbi de Yeon Sang-ho foi o que Guerra Mundial Z – estrelado por Brad Pitt – queria ter sido. Curiosamente, tanto o filme de Sang-ho como Parasita tocam no mesmo tema: a pirâmide social e seus conflitos.

Porém, antes de adentrar o conteúdo do projeto de Joon-ho, vale destacar a forma como o autor entregou tal material ao público. É aqui, que fica explícito o talento e firmeza do trabalho do diretor. Parasita transita entre gêneros, e o faz com muita energia, sendo capaz de estabelecer atmosferas claras, proporcionando enorme oportunidade ao espectador de se aderir à história.

Praticamente todo o primeiro ato é uma comédia desenfreada – e das bem engraçadas. Aí, desaguamos no gênero do suspense, também competente em criar tensão, mesmo em situações escandalosamente cômicas. Por último, estabelece-se um clima pesado, quase de luto. É, nesta nota final que o filme de Joon-ho será sentido em toda sua dor e melancolia.

O trabalho do cineasta funciona como um relógio suíço, pois o próprio não poupou munição em seu terço inicial. Ao fazer uma obra com tamanha vibração histriônica, o cineasta expandiu o emocional do espectador com alegria e gargalhadas, para depois fazê-lo sentir pungentemente as perdas que se sucedem, nocauteando-nos com a realidade e o desmoronamento que afeta todos.

Esta é mais uma amostra da sensibilidade e inteligência emocional de Bong Joon-ho. No violento terceiro ato de Parasita, vemos uma prova de humanidade – além de um aspecto típico da cultura oriental no quesito de respeito e gratidão – que ficou ausente em Bacurau da dobradinha Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles. Enquanto o filme nacional apenas repetiu o óbvio de nossa realidade abjeta como um jornal policial do fim de tarde, onde somos todos bárbaros, sem exceções; a obra do cineasta sul-coreano busca uma reflexão clara no meio de toda a brutalidade: iluminar – no sentido figurado – o parasitismo, intensificando o ressentimento agoniante das classes mais baixas, além da batalha sangrenta entre os mesmos pelas migalhas dos mais abastados. Simplesmente desolador.

Bong Joon-ho provoca dor aguda ao retratar um mundo reduzido onde todas as camadas sociais são impactadas, revelando o abismo social existente entre nós.

Mesmo visualmente, o diretor consegue imprimir de maneira explícita tais diferenças. Sejam pelas incontáveis e longas escadarias espalhadas pela cidade, ou nas paisagens diárias das famílias Kim e Park, os retângulos de observação de cada um destes – estética similar da ficção científica A Chegada, realizada por Denis Villeneuve e Bradford Young.

Parasita também toca levemente no assunto enclausuramento e a segurança ocorrente do afastamento do convívio social, lembrando algumas falas de Morgan Freeman no comovente Um Sonho de Liberdade.

Que a Mostra SP desfile títulos do mesmo calibre que o longa de Bong Joon-ho, que ao final, acossa o espectador e nos faz lembrar o diálogo de Ethan Hawke em Antes da Meia-Noite que fala sobre se manter levemente iludido para continuar motivado.

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