Depois da bem-vinda surpresa que foi a primeira temporada de Sex Education, a série da Netflix retorna em segundo ano com boas evoluções para o seu engajante grupo de personagens, e ainda mais abordagens e argumentos construtivos para os tópicos que aborda.
Sex Education é uma série que poderia, tão facilmente, cair nas típicas armadilhas de ser uma produção que chama atenção por mera polêmica. Mas isso iria justamente contra toda a sua proposta, e esta segunda temporada continua se esforçando para mostrar que os elementos mais interessantes estão nos personagens em si. Não nos tópicos que eles discutem, mas sim como os discutem. No entanto, a nova leva de episódios acaba tornando-se um tanto menos impactante, por não trazer a mesma sensação revigorante que a abordagem introduzida no primeiro ano era capaz de gerar no espectador.
Eu disse no ano passado, e digo de novo: Sex Education consegue ser mais produtiva do que a grande maioria das aulas de educação sexual que os adolescentes sempre precisam comparecer durante o colégio. E nesta nova temporada, tal comparação é, inclusive, evidenciada, com a mãe de Otis indo até o seu colégio para dar uma palestra sobre dúvidas sexuais, e sendo recebida com risadas e um desconforto coletivo que impede qualquer produtividade.
Ao mesmo tempo, também seria ingênuo pensar que a melhor solução para este tipo de problema seria um jovem aluno, filho de uma psicóloga sexual, clandestinamente cobrando dinheiro por aconselhamentos sobre as diversas dificuldades que qualquer adolescente encontra no meio da sua puberdade. E assim, Sex Education se atém ao pensamento que vem tentando retratar com suas duas temporadas: Respostas absolutamente certas provavelmente não existem, mas deixar de questionar seria, com certeza, o pior erro de todos.
A primeira temporada havia apresentado personagens com personalidades e problemas bem distintos entre si, com perspectivas sobre os temas da série que agregavam às dúvidas e questionamentos de cada episódio de forma construtiva. O sucesso da série com o público veio tanto pela sua abordagem descontraída (porém dedicada), de tópicos que poderiam ser considerados polêmicos, como também por conta da evolução destes personagens, que iam se descobrindo de forma relacionável e assumidamente complexa.
Mas o maior chamativo da proposta de Sex Education, no entanto, é a habilidade da série de conseguir trabalhar suas intenções de um jeito que não torne seus discursos e representações, pedantes ou tendenciosos. Não há argumentos morais ou políticos sendo colocados em primeiro plano, mas sim uma tentativa cativante de se olhar para as situações destes adolescentes, e tratá-las com a mesma naturalidade que elas costumam surgir, prezando o bem-estar mental e físico de todos os envolvidos (E a graça da série está justamente em nos fazer pensar que, afinal, esta abordagem não parece tão difícil quanto vemos por aí).
Mas após o primeiro ano, era justo se perguntar para onde a série poderia levar esta proposta, tendo feito um trabalho já tão competente e abrangente. A resposta mais óbvia seria acompanhar os desenvolvimentos entre as relações destes personagens, e claro, é justamente neste ponto que a nova temporada mais se apoia. Não temos mais a mesma dinâmica onde Otis (Asa Butterfield) e Maeve (Emma McKey) lidam com casos diferentes em sua clínica clandestina, com boa parte das dúvidas a serem respondidas nestes novos episódios surgindo em meio às próprias relações.
Felizmente, a temporada traz evoluções envolventes para ainda mais personagens do que no primeiro ano, com até mesmo algumas novas adições ao elenco. Otis, que continua sendo o personagem central deste grupo, deixa de ter o conforto do distanciamento e da “superioridade” que sua “clínica” lhe proporcionava, e precisa confrontar os piores traços de sua personalidade, longe de ser mais bem-resolvido do que qualquer um dos adolescentes que aconselhava. A expansão da abordagem da série, portanto, se estende para além dos tópicos sexuais, e decide dar mais foco à questões sobre relacionamentos em si, do tesão ao romance, da expectativa à flexibilidade, empregando a mesma naturalidade nas tentativas de se responder perguntas tão universais.
Os primeiros episódios desta temporada retomam, com o mesmo tom cômico, o quanto a desinformação e o sentimento de vergonha são capazes de gerar o caos entre estes adolescentes. E é a tamanha insegurança destes personagens, com cada um exibindo este traço à sua própria maneira, que permanece sendo o fator mais atrativo para o espectador se identificar e torcer por eles, ao longo de cada situação confusa ou constrangedora.
Mas indo além, a série decide se aprofundar em alguns tópicos ainda mais delicados, como a situação onde Aimee (Aimme Lou Wood) sofre abuso sexual dentro de um ônibus. Da reação inicial da personagem, tratando como se o caso não fosse nada demais, até as consequências psicológicas que o abuso acaba tendo em sua vida sexual, a abordagem deste arco narrativo nesta temporada é um ótimo exemplo de como Sex Education consegue expor seus argumentos e construções com mais propriedade do que muitas das várias produções atuais que abordam temas semelhantes, mas que não trazem a mesma despretensão ou espontaneidade que faz o espectador conseguir enxergar este sentimento de insegurança como algo perfeitamente plausível.
E um aspecto que se destaca nesta temporada, em comparação à anterior, é uma aparente atenção da direção de certos episódios (como o citado acima) para manejar as transições entre o tom descontraído da série, e os momentos dramáticos mais significativos para o crescimento dos personagens. Com suas longas durações, séries são sempre extremamente dependentes de personagens que possam ser reconhecidos e acompanhados sem muito esforço, e Sex Education acerta ao manter seu foco nestas trajetórias com tanto apreço por mantê-las relevantes ao público atual.
Sex Education continua sendo uma série mais do que digna de atenção, principalmente para um público que talvez nem possa vê-la, por conta da classificação etária. Seus personagens continuam crescendo e se descobrindo de forma cativante, e se a série ainda souber para onde levar sua abordagem em novas temporadas, com novos tópicos sendo explorados com a mesma segurança vista até aqui, então que venha o terceiro ano, e ainda mais dúvidas não tão estranhas quanto alguns imaginam.