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She-Ra e as Princesas do Poder | Crítica - 1ª Temporada

She-Ra e as Princesas do Poder é mais um resultado da produtiva parceria entre a Netflix e a Dreamworks, que vem preenchendo muito bem o espaço destinado ao público infanto-juvenil com produções bem estruturadas e de grande apelo.

A série acompanha Adora, uma órfã criada dentro de um regime militar chamado de A Horda, destinada à ser uma grande capitã deste cruel exército, que se encontra em constante guerra com o reino de Etéria. A personagem incorpora uma boa parte da construção de sua versão original, remanejando alguns aspectos com o intuito de tornar a narrativa mais relacionável para o espectador (como o controle mental de Sombria, que é, muitas vezes, retratado de maneira mais psicológica e menos fantasiosa por aqui).

Originalmente, She-Ra surgiu como uma personagem derivada da série He-Man e os Mestres do Universo, em uma estratégia para apelar ao público feminino jovem, tal qual He-Man havia conseguido com os meninos da época. A personagem era uma irmã perdida de Adam, e possuía, basicamente, os mesmos atributos e características de seu irmão. Nesta nova série, Adora é construída de maneira independente, com uma vibrante mitologia girando em torno de sua própria trajetória.

Poucos percebem, hoje em dia, o potencial que a franquia “Mestres do Universo” possui para ser adaptada à diversos públicos. Em qualquer uma de suas encarnações ao longo das décadas, os personagens sempre foram visualmente impactantes, com dinâmicas e habilidades capazes de deslumbrar o público. Além disso, o mundo e a história em que She-Ra e He-Man se encontram possui combinações interessantes entre a típica fantasia medieval e elementos futuristas que podem ser explorados de maneira distinta, nos tempos atuais.

Um projeto de adaptação da franquia para os cinemas já tramita em Hollywood há um bom tempo, sem muitos sinais de que verá a luz do dia tão cedo. Enquanto isso, She-Ra e as Princesas do Poder tem a oportunidade de aproveitar este universo com uma abordagem mais descontraída do que o público fã do material original poderia preferir, mas que ainda assim possui plena capacidade de conquistar novos fãs através de fórmulas e moldes já estabelecidos dentro do gênero.

Observando as produções mais recentes voltadas para o público infanto-juvenil (principalmente na Netflix), percebe-se que “Avatar: A Lenda de Aang” conseguiu traçar um padrão por onde estas histórias fantásticas devem ser abordadas para atrair um público mais amplo do que apenas crianças e adolescentes. Tal qual em outros exemplos, She-Ra e as Princesas do Poder combina diversas cenas de ação com exposições simples, porém construtivas do universo em questão, além de diversos momentos de alívio cômico e descontração entre os protagonistas.

O velho modelo do “trio protagonista” se prova, mais uma vez, eficiente por aqui. Sem interesses românticos imediatos, os dramas pessoais de Adora vem à tona através de suas relações de amizade, e são retratados com o devido destaque para tornar esta história mais familiar e acessível do que era proposto com a versão original da personagem. A ideia não é que o público mais jovem apenas se deslumbre com a protagonista, mas sim que este possa, também, se relacionar com ela.

O deslumbre e admiração, no entanto, são almejados por diversas caracterizações e dinâmicas com que a série compõe seu grupo de princesas super-poderosas. Todas possuem personalidades distintas entre si, podendo atrair diferentes setores do público-alvo sem necessariamente soarem apelativas ou gratuitas. E seus visuais são igualmente charmosos, gerando, novamente, a possibilidade de se ganhar um bom dinheiro com a venda de brinquedos desta nova versão da franquia (que já lucrou muito nesta área).

O arco dramático de Adora acaba sendo um grande aspecto positivo desta primeira temporada de She-Ra e as Princesas de Poder. Em meio à busca pelas diferentes princesas que compõem a aliança de heróis da trama, a protagonista tem seus principais conflitos envolvendo a personagem Catra (Felina, em português), cuja trajetória de antagonista é igualmente bem trabalhada, ainda que fuja pouco dos padrões de construção. A relação entre as personagens ainda possui muito a ser explorado por futuras temporadas, e deve manter-se central em qualquer continuação.

No entanto, fãs de Avatar, Voltron ou do universo de animações de Guillermo Del Toro (Trollhunters) podem não se sentir tão empolgados com as tramas de She-Ra e As Princesas do Poder, já vistas e exploradas à esmo por diferentes mídias. Embora a execução destas tramas não deixe a desejar, e esteja estruturada de maneira segura, não há muito que possa se chamar de propriamente original na típica jornada do herói de Adora. O ritmo com que a trama se desenvolve, aliado à curta duração dos episódios, no entanto, é o suficiente para manter espectadores engajados ao longo da temporada.

Outro aspecto que pode desagradar fãs das produções atuais (e com certeza frustrará fãs mais velhos), a série não procura aprofundar elementos mais maduros como a política entre os reinos ou as regras de seus sistemas mágicos, tal qual produções destinadas à um público exclusivamente mais infantil. Estas intenções também se estendem às escolhas visuais da série (a batalha final é literalmente encerrada por uma “onda de arco-íris), o que deve servir para assegurar pais e responsáveis de que She-Ra e as Princesas do Poder é adequado para crianças, sem sombra de dúvidas.

Ao mesmo tempo em que a série parece estar convictamente direcionada à um público infanto-juvenil contemporâneo, me pergunto se os traços do desenho não acabarão afastando boa parte de este público-alvo proposto. Hoje em dia, percebo que crianças e jovens adolescentes são muito mais atraídos por produções em 3D, do que por qualquer série ou filme em 2D tradicional. She-Ra e as Princesas do Poder ainda traz animações e composições relativamente simples, que não devem captar a atenção de espectadores casuais.

Mesmo que passe despercebida, She-Ra e as Princesas do Poder é uma comprovação do potencial de “Mestres do Universo” que citei anteriormente. Sua segunda temporada possui muito espaço para explorar outras princesas e outros ambientes deste reino, sem perder seus principais temas e referências. Com um orçamento maior e animações mais impactantes, poderia se tornar uma animação consideravelmente relevante no acervo da Netflix.

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