“Quando você coloca mulheres, pessoas de cor, pessoas queer, pessoas trans, no centro de sua história, você as faz sujeitos e não objetos – você muda o mundo”. A frase é da showrunner e diretora Jill Soloway, que levou seu segundo Emmy seguido por trabalhar atrás das câmeras em Transparent, que retrata a vida de uma mulher transgênero que serve como matriarca de uma família disfuncional. Na noite de domingo (18), o Emmy 2016 fez exatamente isso.
Para quem está acostumado a acompanhar anualmente premiações de grande porte como o próprio Emmy, é difícil digerir que uma delas, na noite de ontem, quebrou todas as regras ao mesmo tempo e sinalizou para um futuro com menos preconceito. Os dois prêmios principais podem ter ido exatamente para quem se esperava (Veep em Melhor Série Cômica, Game of Thrones em Melhor Série Dramática), mas o que aconteceu em várias das outras categorias foi absolutamente surpreendente.
Dos 17 premiados nas categorias de atuação, 10 venceram seus primeiros Emmys da carreira na noite de ontem. Entre todos eles, é quase impossível não achar algo de subversivo em cada um – Sterling K. Brown, Courtney B. Vance (The People v. O.J. Simpson) e Regina King (American Crime) trouxeram a diversidade étnica para a premiação; Sarah Paulson, uma atriz lésbica, venceu por interpretar um ícone feminista que passou por um inferno misógino no momento mais célebre de sua vida e carreira.
Kate McKinnon se tornou a primeira pessoa a vencer o Emmy das categorias principais por um programa de esquetes, o Saturday Night Live; Jeffrey Tambor, em sua segunda vitória pelo papel transgênero em Transparent, clamou por mais talentos trans interpretando suas próprias histórias (“não ficaria triste em ser o último homem cis a interpretar uma mulher trans na tela”); Rami Malek (Mr. Robot) e Tatiana Maslany (Orphan Black) mostraram que o Emmy está aberto a produções de gênero e nicho, do thriller tecnológico à ficção científica.
Precisamos falar sobre o Emmy
Isso porque, até agora, falamos apenas das categorias de atuação. Que tal o fato que, das quatro categorias de direção premiadas na noite de domingo, duas foram vencidas por mulheres? Jill Soloway levou por Transparent, mas Susanne Bier também levou por The Night Manager. E que tal pensar em como o triunfo absoluto de American Crime Story: The People v. O.J. Simpson significa que uma narrativa sobre problemas sociais como o racismo e o machismo foi o grande destaque da noite?
Em um 2016 em que a televisão mostrou por que é a mídia mais relevante e fascinante da atualidade (me desculpem, cinéfilos, mas é verdade), o Emmy foi capaz de engolir seus próprios preconceitos para refletir isso de maneira incrível no palco. É maravilhoso viver em uma era em que produções de gênero encontram excelência e relevância, mas é ainda melhor viver em uma era em que elas encontram reconhecimento.
O anfitrião da cerimônia de ontem, Jimmy Kimmel, guardou algumas piadas bem sucedidas na manga, mas não comandou um espetáculo grandioso. Em rápidas 3 horas de duração, com poucas interrupções e enrolações, o Emmy 2016 apostou mais na significância de suas escolhas do que na megalomania de sua produção – e a aposta foi acertadíssima.
Como todas as revoluções, a do Emmy 2016 começou silenciosamente, mas abriu as portas para gente que ainda vai fazer muito barulho.