É um ditado comum na Arte que, assim que uma obra é lançada, ela deixa de ser de seu criador para se tornar “de todos”. É por isso que os fãs de Star Wars receberam as mudanças de George Lucas nos filmes clássicos de forma tão negativa, já que estamos vendo a adulteração de uma peça histórica que permaneceu anos daquela forma. Algumas mudanças podem ser ótimas (e o próprio Lucas fez algumas delas), mas quase todas acabam mexendo naquilo que não deveria ser tocado. E assim como Lucas fez em Star Wars, J.K. Rowling está fazendo o mesmo com Harry Potter. Mas de forma muito pior.
Se Lucas estava lá refazendo planos e faixas sonoras em lançamentos para home video, em um processo essencialmente técnico, Rowling está vomitando novo “cânone” através da internet. Um dos exemplos mais notórios foi quando a autora escreveu em seu perfil oficial do Twitter sobre como uma das primeiras gerações de Hogwarts não tinha um sistema de saneamento básico, o que forçava os alunos a defecarem no chão e usarem mágica para “se livrar deles”. Qual é a necessidade de se aprender um detalhe tão escatológico da franquia? É quase humilhante e auto-depreciativo, sendo bem sincero.
Os crimes de Animais Fantásticos
Mas o buraco é mais embaixo. J.K. Rowling pode falar o que quiser em seu perfil oficial do Twitter, afinal a rede social é um dos principais pontos de concentração de besteira na internet, bastando olhar para o que alguns jornalistas, atores, diretores e presidentes se atrevem a escrever. Mas Rowling leva a desmistificação de sua própria criação para os cinemas com a franquia Animais Fantásticos, que a Warner Bros certamente implorou para que a autora desenvolvesse. E o primeiro filme até se sai bem na proposta: uma história ambientada 70 anos antes, com novos personagens e um novo universo. A perfeita saída para uma narrativa distinta, com apenas ecos do universo fantástico de Harry Potter. Mas não.
A Warner – e também o público geral – quer mais do Menino que Sobreviveu. Eis que Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald atinge as telas de cinema no ano passado, e o resultado é preocupante. A história do magizoologista Newt Scamander dá espaço para um prequel descarado da história de Harry Potter, com o personagem de Eddie Redmayne sofrendo um retcon desajeitado para se transformar em um “agente” de Alvo Dumbledore, que investiga a ascensão do bruxo das trevas Gellert Grindelwald na Europa. A premissa de um grupo de personagens se unindo para deter um vilão sombrio por si só já é uma repetição de Harry Potter, mas quem dera se o problema estivesse apenas aí.
Ao longo da narrativa de Os Crimes de Grindelwald, Rowling mexeu no passado de diversos elementos da saga original. Nagini, que era uma cobra, é revelada como uma humana que acabou presa no corpo da criatura que futuramente será adotada por Voldemort, enquanto o personagem de Clerence é revelado como o irmão perdido de Alvo Dumbledore – e a forma como tudo isso foi explicitada em tela comprova que Rowling pode ser uma ótima autora e criadora de mundos, mas é péssima roteirista; e só fica pior quando a escritora afirma ter pensado nessas novas reviravoltas “há anos atrás”.
Felizmente, os fãs começam a abrir os olhos. Os Crimes de Grindelwald teve a pior arrecadação em bilheteria da saga até agora, além de ser o primeiro filme da saga a ter uma recepção negativa com a crítica.
J.K. Rowling precisa parar de tentar destruir o mundo maravilhoso que ela mesma criou. Ainda há tempo.