Com produção de Seth Rogen, a adaptação da HQ The Boys chega com sua primeira temporada à Amazon repleta de violência e referências explícitas ao cenário das obras de super-heróis que inundam o cinema e a televisão atualmente.
Rogen e seu parceiro, Evan Goldberg, são conhecidos por suas produções provocativas. No cinema, a dupla dirigiu “A Entrevista”, que tirava sarro do regime totalitarista da Coreia do Norte com críticas ferrenhas, diluídas em uma abordagem absurda e caricata. Na televisão, encontraram-se bem à vontade com sua adaptação de Preacher, cujo material original já carregava uma boa dose da irreverência e do choque que agrada os produtores. Não é surpresa nenhuma, portanto, que a trama e o universo de The Boys tenham chamado sua atenção.
Ao lado de Eric Kripke, os produtores entregam uma série descarada, chamativa por sua violência, mas cujo potencial de explorar e refletir sobre a “cultura dos super-heróis” também a torna bem relevante para o público atual. O mundo de The Boys soa como um prelúdio à trilogia “Executores” do escritor Brandon Sanderson, com os heróis cedendo aos seus impulsos mais arrogantes e desprezíveis, uma vez que se encontram em posições quase intocáveis por conta de seus poderes.
Em uma mistura de realidade com produtos ficcionais, o universo da série procura retratar tanto a atividade destes super-heróis em sua rotina, quanto o impacto destes na sociedade que os cerca e os venera. Como consequência, ergue-se todo um mercado multimilionário em cima das marcas e feitos destes heróis, com filmes que dominam as bilheterias e muito, mas muito merchandising. Entre os mais de duzentos super-heróis que patrulham o planeta, agenciados por um empresa especializada, temos o grupo “Os Sete”, que servem como a elite de super poderosos em uma clara referência à Liga da Justiça da DC.
Neste universo, as atividades heróicas são diretamente analisadas de acordo com seu apelo à públicos demográficos específicos, com a Vought Internacional aplicando estratégias de marketing e política para reger seu império empresarial. Quando um dos heróis mais famosos (um velocista como Flash ou Mercúrio) acaba atropelando e destroçando completamente uma jovem inocente no meio de sua corrida, a empresa logo se dedica a direcionar a opinião pública e “varrer para debaixo do tapete” qualquer culpa que possa recair sobre o “herói”. A estratégia funciona perfeitamente, a não ser pelo namorado da jovem, que continua sofrendo por sua morte e se recusa a aceitar dinheiro em troca de seu silêncio.
O jovem Hughie (Jack Quaid) é procurado por um misterioso homem (interpretado por Karl Urban) que diz ser parte do FBI, e que lhe revela o quanto a empresa Vought costuma fazer este tipo de acobertamento constantemente, torcendo para que o rapaz possa lhe ajudar a plantar uma escuta dentro da sala dos Sete.
Dividindo o protagonismo da série, também temos Annie (Erin Moriarty), uma aspirante à super-heroína com poderes deslumbrantes, mais conhecida por seu nome de guerra: Starlight. A jovem acaba sendo chamada para integrar “Os Sete” depois um processo de audições e seleções que sempre remete à indústria midiática e esportiva de forma provocativa.
Conforme este primeiro episódio prossegue, vamos sendo introduzidos aos bastidores desta indústria de super-heróis, entendendo o quanto estas figuras se mostram arrogantes e egocêntricas, pouco preocupadas com o bem-estar dos inocentes, mas atentas às suas porcentagens na participação dos lucros da empresa que vende suas imagens. O que chama atenção na série, é justamente perceber o quanto seria bem possível que o mundo acabasse se entregando à esta indústria caso os heróis da Marvel e da DC que dominam os cinemas fossem reais, e carregassem toda a adoração que já carregam como fictícios.
Os visuais da série tem altos e baixos, limitando sua excentricidade a sequências específicas, geralmente voltadas para a depravação ou a violência destes super poderosos. Para entender a classificação indicativa da série, não é preciso olhar além da cena em que acompanhamos um bar onde os heróis podem extravasar seus fetiches e apetites sexuais de formas absurdas com seus poderes. Mas também temos cenas, como o atropelamento que dá início à história, onde o choque visceral destes poderes sendo levados à uma interpretação mais realista é evidenciado.
The Boys tem um piloto competente que apresenta seus protagonistas deixando claras as suas motivações e desilusões, além de estabelecer uma dinâmica cativante para este universo, prometendo reviravoltas e conspirações. Os ganchos finais do episódio indicam circunstâncias previsíveis para dar continuidade à estes conflitos, mas o público que se interessa por todas as produções relacionadas à HQs, com certeza deve dar uma chance à esta produção da Amazon. Se não pela reflexão do mercado, pela diversão grotesca que já é característica da dupla de produtores da série.