Faltam 14 dias para Star Wars: Os Últimos Jedi aportar nos cinemas brasileiros. A expectativa dos fãs, é claro, está absurdamente em alta, com a infinidade de trailers, capas de revista, matérias especiais, comerciais de TV e fotos inéditas inundando a internet todos os dias, tudo desenhado perfeitamente para aumentar ainda mais um hype que nem precisava ser aumentado.
Com direção de Rian Johnson (Looper: Assassinos do Futuro), Star Wars: Os Últimos Jedi pode marcar o começo do fim para a saga da família Skywalker, iniciada em 1977 e contada em três trilogias profundamente distintas entre si como cinema, mas inexoravelmente conectadas como narrativa. J.J. Abrams, que dirigiu o começo da nova trilogia com o O Despertar da Força (2015), vai retornar para finalizar o trabalho no Episódio IX, marcado para lançamento em 20 de dezembro de 2019.
Depois desses dois filmes, os planos da Lucasfilm/Disney incluem uma nova trilogia desconectada da principal, também a ser escrita e dirigida por Johnson, e a continuação dos filmes “Uma História Star Wars”, tradição de derivados começada com Rogue One (2016) e que deve continuar com Han Solo (24 de maio de 2018) e vindouros filmes de Obi-Wan, Boba Fett e sabe-se lá o que mais está em desenvolvimento nesse exato instante nos escritórios da empresa criada por George Lucas e tocada por Kathleen Kennedy.
No entanto, se esse será realmente o fim da saga principal, após mais de quatro décadas, vale a pena pensar: O que essa narrativa colossal, espalhada por nove filmes, realmente quis nos dizer? A história dos Skywalker é sobre o quê, afinal?
Mergulho profundo
Superficialmente, é fácil pensar que a história contada por Star Wars desde aquele clássico de 1977 é sobre família. Afinal, alguns dos momentos mais marcantes de toda a saga são revelações e reviravoltas envolvendo relações familiares – não falo só do famoso “Eu sou seu pai” em O Império Contra-Ataca (1980), mas também da morte de Han Solo nas mãos de seu filho Kylo Ren em O Despertar da Força (2015), da vingança brutal de Anakin contra os que mataram sua mãe em O Ataque dos Clones (2002), e por aí vai. Cada uma das trilogias tem momentos pivotais focados na relação de seus personagens com suas famílias.
Em uma dimensão “micro”, portanto, talvez Star Wars seja sobre família, como ela nos molda e como, em sua absoluta e inexplicável conexão com quem somos, ela é capaz de definir os caminhos fundamentais que seguimos nas nossas vidas. Ao olhar para o todo da saga, no entanto, fica evidente que ela não pode ser só sobre família, ou ao menos que ela extrapola esse tema principal para explorar ramificações mais profundas relacionadas à nossa relação com o mundo fora da esfera familiar e dentro de uma esfera ideológica.
O idealismo da política de bem e mal em Star Wars é flagrante, e herdado dos serials de ficção científica nos quais George Lucas se inspirou para criar os filmes originais, estruturados em torno de uma narrativa mitológica simples focada na jornada de herói de Luke, mas rebuscada com os detalhes dos personagens ao seu redor. Inserindo a princesa que não precisa de salvamento (Leia), o rebelde anti-heroico relutante (Han Solo), ou um arco de redenção para seu vilão (Vader), Lucas subverteu com habilidade o esperado de uma narrativa de aventura, e continuou subvertendo na segunda trilogia, que, por todas as suas deficiências como cinema, introduz nuances expressivas à política de Star Wars.
Essa jornada simplista de bem contra o mal, luz contra escuridão, aos poucos se tornou o complicado conto moral do que acontece quando instituições falidas e burocráticas levam a um despotismo e a um autoritarismo perigoso, e o que é preciso para lutar contra ele. Com seus movimentos de Resistência ou rebeldia (seja contra o Império ou a Primeira Ordem), Star Wars era essencial e urgente como parábola política nos anos 1970 e 1980, quando os EUA mergulhavam em uma onda autoritária e conservadora – e é também agora, quando o mesmo parece estar acontecendo. Se não aprendemos com a história, quem sabe aprendemos com a ficção?
O que é preciso?
Estabelecido tudo isso, a pergunta que resta é: O que é preciso para que Os Últimos Jedi e o vindouro Episódio IX concluam a saga dos Skywalker e liberem Star Wars para perseguir outras aventuras, provavelmente com outras temáticas? Uma das promessas mais antigas da franquia é a profética chegada de um personagem que iria “trazer equilíbrio à Força”, acabando com a disputa entre Jedi’s e Sith’s pelo domínio do poder, e supostamente selando uma paz duradoura no universo.
Qui-Gon achava que Anakin, nascido em uma “concepção imaculada” (sim, como Jesus!), era a resposta para essa profecia, mas ele estava famosamente errado. A nova trilogia nos faz crer que Rey pode ser o indivíduo em questão, porque a forma como sua trajetória foi desenhada até aqui indica isso de forma agressiva – seu uso prodigioso da Força, sua origem misteriosa, sua jornada em Os Últimos Jedi treinando com Luke Skywalker. A personagem de Daisy Ridley pode ser a chave para trazer a saga de Star Wars ao seu final e entregar tudo o que George Lucas e companhia prometeram.
E que metáfora seria! A saga que começou com o conflito simplista e definitivo entre luz e escuridão terminaria com a personagem capaz de unir os dois lados no que sem dúvida seria um compromisso moral e de princípios. A ideia da extinção do mal absoluto e do bem absoluto em prol de um entendimento mais complexo de nossa própria construção como seres humanos reflete a jornada da saga como obra de ficção tanto quanto a jornada de seus personagens. Consagrada como parte da cultura pop, é hora de Star Wars se fazer valer como uma narrativa que compreende e reflete a complexidade dos nossos tempos.