Bem-vindos de volta à Olhar Geek! Todo ano é a mesma história. Assim como a temporada de premiações, a temporada de verão americana e a temporada de retorno e de finalização das principais séries dos EUA, a época da Comic-Con chega e não só os sites de notícias vão à loucura com a quantidade de novidades que aparece, como os fãs ficam ansiosos esperando os painéis de seus títulos favoritos. A celebração anual da nerdice suprema e de tudo o que vem com ela se torna mais disputada e vigiada a cada ano, e 2016 não é diferente.
Público recorde, quantidade de painéis e convidados recorde, número puro de títulos e empresas representados recorde… Tudo nessa Comic-Con 2016 é maior, mais bombástico e mais surpreendente do que na anterior. Kevin Feige, Kevin Smith, Conan O’Brien, Stan Lee, John Barrowman, Robert Kirkman, Chris Hardwick, J. Michael Straczynski… todos os ícones e entertainers preferidos do público nerd comparecerão apresentando ou conduzindo, sozinhos, seus próprios painéis. Nem toda Comic-Con é a mesma, mas muitos nomes se repetem, para o agrado especialmente de quem é fã.
Claro, as “informações exclusivas” que serão divulgadas de cada um dos filmes que terão espaço no evento continuam firmemente escondidas embaixo dos panos. Espere pôsteres, trailers, descrições e detalhes novos providos por atores, diretores, compositores de trilha-sonora, roteiristas e criadores em geral. Espere momentos surpreendentes e anúncios bombásticos – mesmo que você não esteja em San Diego entre os dia 21 e 24 de julho, esses serão momentos em que a experiência de fã vai tomar conta de você.
Nem só do básico e da expectativa por revelações inéditas e painéis explosivos vive a Comic-Con, no entanto. Enquanto nos aproximamos da edição 2016 do evento, vale pensar sobre o que uma simples olhada na agenda do evento (veja-a completa nos links um pouco abaixo) pode não revelar: que como evento de cultura pop, a Comic-Con oferece um esforço genuíno de ser um momento de conferência e confraternização, sim, mas também de reflexão e evolução de uma produção cultural cada vez mais popular e fascinante, mas também cada vez mais importante e politizada.
Confira a programação de filmes, games e HQs
Confira a programação de séries
Cinema vs TV
Deu uma olhada nas nossas agendas completas? Então vem cá: em termos puramente quantitativos, a Comic-Con 2016 será majoritariamente um evento televisivo. Isso não é exatamente novidade, mas é algo que passa sem ser suficientemente notado ano após ano. O que leva a TV a ter mais presença em um evento de cultura pop? A nossa produção televisiva popular hoje em dia é mais destacada, ou maior, do que a produção cinematográfica? A produção de gênero (ficção científica, terror, comédia) e de nicho dominou a TV, enquanto continua compartimentalizada no cinema? Ou será que a Comic-Con simplesmente é uma oportunidade melhor para as emissoras divulgarem suas séries do que para os estúdios divulgarem seus filmes?
Das estreias da próxima fall season, que começam a chegar em setembro e outubro, é difícil achar aquela que não tenha agendado horário para apresentação. Das comédias The Good Place, Son of Zorn, Powerless (da DC), Family Guy, Os Simpsons, Archer e American Dad até suspenses, ficções científicas muito e pouco vistas, séries criminais, reboots (24: Legacy e Prison Break são as mais aguardadas)… todo mundo que almeja ser alguém na próxima temporada de TV estará por lá.
Alguém provavelmente conseguiria dizer que, mesmo com a atenção e espaço maciços dados às séries, os eventos cinematográficos continuam sendo os mais aguardados. Esse alguém estaria apenas parcialmente correto – de fato, talvez os dois eventos mais esperados dos quatro dias de convenção sejam: o da Warner/DC, que vai falar de Esquadrão Suicida, Animais Fantásticos e Onde Habitam, Mulher-Maravilha, Kong: Skull Island e afins; e o da Marvel Studios, em que Kevin Feige apresentará o futuro do universo cinematográfico Marvel, incluindo novidades de Doutor Estranho, Guardiões da Galáxia 2 e outros lançamentos.
Mas você sabe quais painéis provavelmente estarão igualmente lotados? Os das séries da CW – os bate-papos com os elencos de Supergirl, The Flash, Arrow e Legends of Tomorrow, agora que as quatro estão na mesma emissora e fazendo barulho sobre um mega-crossover entre todas elas, serão sem dúvida alguns dos momentos mais excitantes e brilhantes da convenção. Os vários eventos de comemoração dos 50 anos de Star Trek, os painéis de Teen Wolf, Luke Cage, Mr. Robot, The Walking Dead, Game of Thrones, Agents of SHIELD, American Gods, Preacher, The Magicians, Ash vs Evil Dead e uma infinidade de outras séries também serão certamente disputados.
E se a resposta é que sim, a televisão hoje em dia é a maior produtora de cultura geek, com títulos de nicho muito específicos que se tornam atrações de apelo muito maior do que se espera, o que isso significa, e como chegamos aqui? O universo mais expansivo de produtoras de TV e o alcance maior da mídia pode ter facilitado com que essas produções acontecessem em um sistema que passou a ver o público geek como um alvo mais valioso. No cinema, filmes “de gênero” dificilmente quebram os limites da “caixinha” em que foram colocados – o modelo cinematográfico garante que exista a possibilidade de mais produções independentes que explorem linguagens e estilos diferentes, mas só a TV dá a possibilidade para que essas produções alcancem um público maior do que previsto para elas.
Portanto, não é nem um pouco a toa que a programação completa de séries da Comic-Con 2016 é bem mais longa (e, em muitos sentidos, mais empolgante) que a programação de cinema – não só títulos e diversidade abundam dentro da TV, como esses títulos são muito mais bem-sucedidos em francamente servirem aos interesses do público geek do que seus companheiros do cinema.
Papo sério
Outra parte bacana de notar na programação da Comic-Con 2016 é uma que não está na nossa agenda, e provavelmente você não vai ver repercutida por aí nos grandes sites que vão falar sobre o evento: os painéis com especialistas e pessoas de dentro da indústria que falarão sobre vários aspectos da produção e consumo de cultura pop. Tem uma série de palestras chamadas Comic-Con Film School, por exemplo, que ensina a fazer produções independentes com pouco dinheiro para cineastas, roteiristas, atores e produtores amadores. Testemunhar esse tipo de programação dentro de um evento tão grande e popular quanto a Comic-Con é interessante para perceber que o espírito de convenção e experiência de aprendizado não morreu.
Painéis de discussão sobre diversidade nas mais diversas mídias e ângulos, dos quadrinhos à TV, da representação LGBT à feminina, em frente ou atrás das proverbiais câmeras (ou canetas), também sobram; conversas sobre e com a imprensa de entretenimento; workshops com autores e criadores renomados que vem com a intenção de passar sua experiência adiante. Em termos de cobertura, é claro que vira notícia o que de mais bombástico é revelado durante a Comic-Con, mas sua constituição como evento não está só no que chega às manchetes – ao contrário de alguns outros acontecimentos anuais (a CinemaCon, por exemplo), essa não é só uma oportunidade de ouro para estúdios e emissoras divulgarem seus produtos.
Na contramão dessa tendência de marketing, a Comic-Con cada vez mais se torna uma gigantesca tenda de discussões, reflexões, celebrações e conexões entre os mais diversos cantos e clamores da cultura pop. É um evento capaz de celebrar cosplays, criações trash e cult, e falar sério sobre elas ao mesmo tempo. É um dos poucos acontecimentos do ano que nos permite reafirmar que cultura pop faz a diferença, que não é “só um filme, só uma série, só uma história em quadrinhos”. Como parte indissociável da natureza humana, a cultura precisa ser um instrumento social, em todos os sentidos – e é por isso que uma gigantesca socialização como a Comic-Con é tão saudável, e tão excitante, ano após ano.
A Olhar Geek retorna após a Comic-Con, no dia 26.
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