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Crítica | Homem-Aranha no Aranhaverso

Homem-Aranha no Aranhaverso chegará aos cinemas como uma aposta da Sony com o que parecia uma tentativa de estabelecer uma possível franquia de animação, já que a versão live action de Peter Parker parece ter funcionado mais com a Marvel Studios. O longa não poupa esforços para aproveitar todas as vertentes possíveis do Cabeça de Teia, trazendo diversos heróis de realidades alternativas. Dessa forma, soa como um possível teste para o caso de Venom não funcionar. Com a bilheteria do filme do vilão, é difícil dizer que ele não funcionou, apesar da reação da crítica. Contudo, ao que parece, a Sony pode ter acertado nos dois testes.

O filme traz uma trama que pode ser considerada, de fato, ousada. Usando as realidades paralelas que existem nos quadrinhos, o filme brinca com uma mistura que é bem explicada em um plano do Rei do Crime. Assim, o que poderia ser um filme infantil acaba por ser um tanto complicado para o público mais jovem, e deve ser mais apreciado em sua amplitude para aqueles que tem um conhecimento prévio mínimo dos quadrinhos. Mesmo assim, o filme passa longe de ser adulto e é apreciável por todas as idades sem maiores problemas.

Outro fator a se apontar é que a trama dificilmente existiria caso a história de Peter Parker não fosse tão explorada no cinema e difundida na cultura pop. A introdução de Miles Morales e a suas referências ao enredo de Parker funcionam por si só, mas é somente pela exaustão da origem de Homem-Aranha original que o funciona. Dessa maneira, podemos acompanhar a ascensão de Morales sem nos preocupar com os demais heróis, que estabelecem rapidamente suas origens com paralelos ao conteúdo já conhecido do público.

Com oito filmes no currículo de Parker, sendo seis como protagonista, e diversas séries animadas de sucesso, não só o Homem-Aranha está bem fundado na cabeça do público, mas também seus vilões e coadjuvantes, que permeiam o longa sem maiores problemas de introdução, criando um rico apanhado do universo do Aranha, em versões por vezes diferentes, mostrando o melhor que a Marvel pode fazer dentro de sua lógica All New All Diferent, série que traz diferente indivíduos para manto já conhecidos, explorando personagens com novos gêneros, etnias e nacionalidades.

É assim que o longa aposta no conhecimento prévio do público. Vale dizer que mesmo sem ele, não há, de fato, uma complicação que impeça o espectador de entender o que está acontecendo. Assim, Homem-Aranha no Aranhaverso consegue ter seus dois pés fincados no nicho, ao mesmo tempo em que não exclui totalmente quem está de fora, ainda que não funcione plenamente como um primeiro contato. É preciso conhecer Peter Parker para entender o que significa realmente o estado no qual o encontramos.

O enredo é de todo cativante e corajoso. Enquanto proporciona uma história que entretém os fãs, traz a origem de Morales sem realmente parecer um filme de origem. Seguindo alguns passos propostos da jornada do herói por Joseph Campbell, mesmo que de uma forma um tanto sucateada, a realidade do protagonista é tão interessante por sua etnia e ascendência hispânica dentro dos Estados Unidos que, mesmo sem abordar profundamente esses fatos, o público deve senti-los todo o tempo. Aqueles com ciência das problematizações vividas por Parker, poderão ver as mesmas questões abordadas de maneira tão diferente. Da maneira que o filme se propõe, fica de fato impossível não traçar paralelos, e isso pode ser um atrativo para o público.

Mesmo apostando em uma temática bastante ousada para o cinema, o filme não foge de certas fórmulas. Morales é, ainda, o novato pelo qual acompanhamos esse universo, de forma a nos inteirarmos dele, mesmo que ele tenha já um breve conhecimento sobre a vida heroica do Homem-Aranha. O monomito, mesmo que levemente disfarçado, também se faz presente. E mesmo com uma história bem fechada, a animação abre portas para explorarmos mais a vida de Miles Morales, Gwen Stacy, Peni Parker e até mesmo do Porco-Aranha. O clássico Peter Parker caba por ficar um tanto quanto de forma, completamendo totalmente uma saga, mas o próprio Aranha Noir pode ser aproveitado também em um spin off, talvez com menos humor, apesar de seu papel recorrente como alívio cômico no longa.

Se Homem-Aranha no Aranhaverso traz algo forte é a sua identidade visual. O traço do filme é bem característico e brinca com isso o tempo todo. Apesar de Gwen Stacy e Peter Parker serem apresentados dentro de uma lógica idêntica à Morales, as personagens de Peni Parker, Porco-Aranha e Aranha Noir trazem uma nítida diferença de animação para o longa. Ainda assim, estes cabem perfeitamente dentro do universo explorado, e seus momentos dissonantes cabem perfeitamente ao humor, quando Aranha Noir tem limitações de cor, Peni traz aspectos de animes para o filme e Porco-Aranha brinca com o fato de ser um desenho animado, tudo isso sem proporcionar uma estranheza ao público. Além disso, elementos dos quadrinhos estão presentes o tempo todo.

O trabalho de voz original do filme também precisa ser ressaltado. Todos os personagens principais e secundários estão muito bem interpretados, mas os destaques ficam para aqueles que precisaram imprimir emoções mais dramáticas durante o longa. Shameik Moore traz um ótimo Miles Morales e, apesar de Luna Lauren Velez apresentar uma boa Rio Morales, seu pouco tempo de tela parece proporcionar um destaque maior para o lado Davis da família. Jefferson, pai de Miles, é muito bem vivido por Brian Tyree Henry e Aaron, tio de Miles, é o grande destaque na voz de Mahershala Ali.

Homem-Aranha no Aranhaverso sabe aproveitar muito bem o universo que tem para usufruir, contando uma história divertida e que cumpre o que propõe de forma irrefutável. Ao mesmo tempo, quando analisado fora de um nicho, o filme pode ser confuso ou parecer ter suas informações jogadas sem preocupação de se explicar. Mesmo assim, pouco atrapalharia a diversão do público que, graças a animação, ganhou um aventura visualmente incrível. Assim como Vingadores: Guerra Infinita, embora de uma forma bem diferente, o longa precisa de conteúdos prévios para funcionar em sua plenitude, por isso o ideal é se preparar antes de ir ao cinema.

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