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Crítica | Vingadores: Ultimato (Com SPOILERS!)

CUIDADO!!! ESSE TEXTO CONTÉM SPOILERS DE VINGADORES: ULTIMATO E MAIS FILMES DO UNIVERSO CINEMATOGRÁFICO MARVEL!

Vingadores: Ultimato nem havia estreado e já carregava nas costas o status de ser um recordista nas bilheterias. Ultrapassando a maior pré-venda da história, não era nem preciso ter assistido os mais de vinte filmes que o antecedem para saber que o novo longa da Marvel teria proporções épicas. Mesmo que o próprio Kevin Feige, o dono dos bastidores do Universo Cinematográfico Marvel não considere este, mas Homem-Aranha: Longe de Casa, o final da chamada Fase 3 do MCU, é inegável que Ultimato tem todo o clima de fim de jogo do qual vem se propagandeando nos últimos doze meses.

O longa é muito seguro de si, e não poderia deixar de ser. Com o hype criado para sua estreia, e a discussão incessante de teorias sobre o que poderia acontecer, é quase óbvio prever que seus acontecimentos já tenham sido adivinhados pela imprensa e pelos fãs. E, de fato, os mais aficionados pelos debates em fóruns e redes sociais podem ter a impressão, após ponderar de cabeça mais fria, que alguns pontos, até mesmo os mais importantes, foram adivinhados. Contudo, a maneira como o longa se desenrola é em sua totalidade surpreendente e por isso deve agradar ao fã mais perfeccionista.

O que a Marvel Studios fez para a indústria cinematográfica de Hollywood é sem precedentes. Mesmo considerando que franquias existam há tempos e que sua popularidade já havia atingido um patamar impressionante desde o final dos anos 70 com a saga de Star Wars, o estúdio prova de uma vez por todas que Ultimato é um apogeu não só para o seu universo compartilhado, mas também para o cinema como um todo. Ao trazer uma supersaga para a telona, o que se vê é no mínimo uma revolução em termos de narrativa, maior do que qualquer coisa já vista no audiovisual ou quadrinhos. Em questão de entretenimento, não é cedo para falar que o MCU pode ser considerado o suprassumo atual dentro de sua indústria.

Ultimato segue imediatamente o tom proposto por seu antecessor, Vingadores: Guerra Infinita. Mais do que isso, se destaca ao aprofundar ainda mais o clima melancólico explorado nos minutos finais do filme de 2018. Nesse ponto, poderia se argumentar que o longa é dissonante dos demais de seu universo, não fosse toda a lógica empregada para construí-lo. Começando em cold opening, o filme começa nos relembrando do estalar de Thanos. O que poderia caber perfeitamente como uma cena pós-créditos em Guerra Infinita foi acertadamente colocada como abertura de Ultimato, mostrando o Gavião Arqueiro de Jeremy Renner sobreviver ao estalo. Diferente de sua família.

Assim, o roteiro traça para Clint Barton sua identidade de Ronin, uma das facetas da depressão pós-perda que veremos durante o filme. Cada um dos seis Vingadores originais é ponto chave para entendermos as diferentes propostas da Terra pós Thanos. Se usarmos como referencial as cinco fases do luto propostas por Elisabeth Kubler-Ross, podemos supor que Barton é o que menos avançou, parando na segunda fase, a raiva. A decisão de deixa-lo fora do último filme foi essencial para que seu caminho se tornasse tão interessante. O então herói, que tinha participação fundamental nos dois primeiros filmes do crossover Vingadores, é mostrado pós-salto temporal como um assassino que tem como missão eliminar aqueles que ele não considerar dignos após o genocídio indiscriminado de Thanos. Difícil imaginar uma reviravolta mais surpreende do herói que em Era de Ultron se mostra um pai preocupado com a família em sua casa de campo.

O segundo Vingador que não chega na aceitação é o Thor de Chris Hemsworth, que mesmo com o clima cômico proposto pós Thor: Ragnarok, mostra o Deus do Trovão com uma nova faceta depressiva. Se Guerra Infinita o mostra em uma jornada paralela de ascensão, enquanto busca uma arma capaz de matar o vilão, Ultimato mostra nele mais uma de suas quebras ao retratá-lo em uma versão mais próxima dos quadrinhos que mostram Thor, O Indigno. O herói começa sua jornada no filme com o clima de desapontamento por não ter tido sucesso em matar Thanos. Após conseguir fazê-lo, ele sucumbe ainda mais ao sentimento, sabendo que fez isso na hora errada. Saber que seu provável futuro esteja em Guardiões da Galáxia é não só um chamariz para um grupo que já é um sucesso popular, mas também uma amostra de que mesmo com um pensamento fechado para contar sua história geral, a Marvel Studios compreende perfeitamente suas personagens e sabe usá-las da melhor forma, se propondo ao mesmo tempo em dar caráter de obra aberta para seu universo.

Algo que não pode tirar pontos do filme, mas pode ser considerado um problema do estúdio, é a sua propaganda. Apesar de ter conseguido manter os segredos do seu enredo, muito alarde se fez a importância que Capitã Marvel teria no filme. Após um filme que gerou as mais diversas reações, o que não atrapalhou seu sucesso na bilheteria, a Carol Danvers muito bem interpretada por Brie Larson se mostra quase que desnecessária para a trama principal. Mesmo sendo a responsável por resgatar Tony Stark, a impressão passada pelas declarações de Kevin Feige e dos Irmãos Russo é que Danvers seria uma ferramenta essencial na luta contra Thanos, o que não aconteceu. Se o MCU for de fato ser liderado pela personagem nos próximos anos, devemos esperar um tanto de esquecimento do planeta Terra ou uma reformulação nos ideais da personagem que, em termos de poder e caráter, parece bem construída demais para uma reformulação. O destaque dado à Valquíria de Tessa Thompson não só é maior como mais importante para o destino do MCU.

Quem de fato se destaca na trama além dos seis originais é a Nebula de Karen Gillan. A personagem é responsável por movimentar todo o roteiro, desde a vingança imediata contra Thanos, passando por informações que só ela seria capaz de ter, como por armar o tabuleiro para a batalha mais épica já apresentada pelo MCU. A complexidade que foi construída para sua personagem de forma sutil nos dois filmes de Guardiões da Galáxia cai como uma luva para o estúdio. Podemos considerar Nebula como a prova definitiva de que, mesmo tendo desvios no caminho, ou filmes episódicos que poderiam ser esquecidos, a Marvel Studios legitimamente criou um universo complexo para contar uma história que visava chegar do ponto A ao ponto B, sem se perder ou alterar o seu destino.

O Bruce Banner de Mark Ruffalo talvez possa ser o original mais deixado de lado para o enredo. O que não significa que sua personagem não teve uma evolução própria. Ao se transformar em Professor Hulk, uma mistura entre Banner e o gigante esmeralda, sua personagem parece ter se firmado mais para o futuro do MCU do que a maioria dos outros originais. É claro que ele foi o único capaz de reverter o estalo de Thanos sem morrer no processo, e isso já configura uma participação importante no filme. Mas seu novo paradigma encaixa bem sua personagem como um possível operador de bastidores de futuras equipes de Vingadores, se é que veremos alguma. Sua nova posição pode ser análoga, ou ao menos mais próxima, de um Hank McCoy, o Fera, nos quadrinhos dos X-Men. Podendo ir para a ação, e se mostrar importante nela, mas funcionando melhor como um pensador por trás da equipe.

A Viúva Negra de Scarlett Johansson é a Vingadora original mais surpreendente do filme. Com poucas especulações para o seu papel nesse longa, bastante por em Guerra Infinita ter sido usada como uma espécie de sidekick na equipe clandestina da versão Nômade do Capitão América, sua participação é essencial no filme. Se Banner é o Vingador que mais se estabilizou na aceitação do pós estalo, Natasha Romanoff assume a liderança do que restou dos Vingadores, e é graças ao seu sacrifício, não só pela Joia da Alma, mas pela determinação de manter viva uma força tarefa de heróis, que o plano para a derrota de Thanos pôde ser concretizado.

Ironicamente, mesmo não sendo uma surpresa, o plano fica basicamente por conta do Scott Lang de Paul Rudd. Além de abrilhantar o filme com seu alívio cômico, o Homem-Formiga representa a esperança de reverter o feito de Thanos. Não só por voltar da categoria de desaparecido, mas também por arquitetar o conceito de viagem no tempo que, não só é a resposta para reunir a Joias do Infinito, mas também para celebrar diversos momentos do MCU. O artifício do roteiro permite que o espectador revisite filmes Os Vingadores, Capitão América 2: O Soldado Invernal, Guardiões da Galáxia e até mesmo o criticado Thor: O Mundo Sombrio.

Se todo o MCU é representado em Ultimato, os grandes destaques não poderiam deixar de ser os finais dos arcos do Capitão América de Chris Evans e do Homem de Ferro de Robert Downey Jr. O reencontro de Steve Rogers e Tony Stark não é o abraço emocional de dois amigos há muito separados por uma desavença que se tornou boba perante as circunstâncias. Ao invés disso, o que vemos é um Rogers disposto a ajudar na reconstrução do mundo e um Stark mais preocupado com a sua vida pessoal. Dessa forma, o filme coloca ambas as personagens em posições similares as quais começamos a acompanhar suas histórias.

Rogers é a personagem mais interessante em termos de adaptação ao novo paradigma criado por Thanos, já que ele sabe exatamente o que é se ver em um mundo onde grande parte de sua vida lhe foi arrancada repentinamente. Nunca se explorou melhor o fato de que Rogers é um homem fora de seu tempo. Depois de ser usado como arma e propaganda por uma nação, e ver que esses ideais aos quais foi impelido a representar se tornaram corruptos, é mais do que satisfatório ver o final de seu ciclo como Capitão América. Algo que pode ser considerado como feito já em Capitão América: Guerra Civil, mas que só engradece com o seu passar de manto. Ou melhor, seu passar de escudo para Sam Wilson, o Falcão de Anthony Mackie, que deve representar agora uma nova e mais interessante faceta dos Estados Unidos: uma representação atual em contraponto aos EUA da segunda guerra mundial. Somado à isso, o final feliz dado para a personagem, que finalmente recupera o seu encontro perdido com a Peggy Carter de Hayley Atwell, não é só um alívio depois da bomba emocional que é a morte de Stark, mas também deixa o MCU em posição de explorar participações pontuais de Rogers como o respeitado veterano que vemos em sua contraparte nos quadrinhos.

Já Tony Stark, o pontapé inicial desse universo compartilhado é, de longe, o arco mais bem desenvolvido da Marvel Studios. O abandono de sua vida de playboy irresponsável e suas contínuas tentativas de consagrar a Jornada do Herói, como proposta por Joseph Campbell, e muitas vezes frustradas por ele próprio, finalmente o levam a ascensão. Seu sacrifício representa não só o ápice de sua jornada própria, mas do trabalho de todo um universo criado em torno de sua figura. Ao mesmo tempo que a crítica e os fãs possam ver falhas nessa jornada, como o esquecível Homem de Ferro 3, pode se notar uma leve incongruência no seu ato final. Como o Doutor Estranho de Benedict Cumberbatch deixa claro ao entregar a Joia do Tempo para Thanos, Stark seria peça chave para a vitória dos heróis sobre o vilão genocida. A participação de Stark como a mente genial que descobre uma maneira de viajar pelo tempo por si só já explicaria sua importância.

Contudo, um momento pessoal na batalha final entre a personagem e Stephen Strange podem deixar o espectador com a impressão de que apenas o seu sacrifício, que dizima Thanos, sua Ordem Negra e seus exércitos, é o motivo por sua vida ter sido barganhada por Strange. Contudo, sua contribuição total na obra não poderia ser subestimada em nenhum momento. Ao retratar isso em seu enterro, por mais compreensível que seja usar de sua trajetória como um todo para enaltecer a personagem, talvez sua contribuição total nesse filme isolado possa passar despercebida pelos fãs.

Abusando da cultura pop de forma acertada, Vingadores: Ultimato é o final perfeito para a supersaga de toda uma década que colocou os super-heróis nas lideranças das bilheterias dos últimos anos. Sua direção e produção não podem também passar despercebidas, trazendo efeitos especiais que influenciaram o cinema de alto orçamento como um todo. O ápice do filme, que culmina em uma batalha épica onde podemos ver o potencial completo de todos os heróis apresentados pelo MCU nesses anos deve ser um deleite para os fãs do universo. Mais do que isso, suas autorreferências, como trazer de volta Robert Redford, Tilda Swinton e Rene Russo, ou mesmo colocar a Pepper Potts de Gwyneth Paltrow em uma armadura para lutar em harmonia e sincronização com o Homem de Ferro são apenas detalhes, mas evocam toda a nostalgia e expectativa que somente dez anos de trabalho consciente poderiam proporcionar.

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