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Os 15 melhores episódios de TV de 2017

O ano de 2017 foi terrível em muitos sentidos para a indústria do entretenimento – seja pela consolidação de um monopóliopela exposição de um abismo de impropriedades sexuais ou pelo êxodo em massa de espectadores do cinema, que preferiram assistir filmes em casa.

Para a televisão, no entanto, a Era de Ouro continua a todo vapor, com mais produções do que nunca, de forma que é impossível para qualquer crítico ou jornalista (incluindo este que vos fala) assistir a tudo que é considerado “TV imperdível” durante o espaço de um ano.

A lista que você encontra abaixo elenca os 15 melhores episódios de TV que eu tive o prazer de ver em 2017, com apenas uma regra: não são permitidos dois capítulos da mesma série no ranking. Esse artigo não se pretende um review completo do mundo da televisão no ano. Tudo o que podemos fazer, em plena Peak TV, é tentar explorar da melhor forma possível, fazendo escolhas de qualidade.

Foi o que tentei fazer. Confira o resultado:

15. “Episode 2” (Mindhunter 1×02)

Mindhunter é uma daquelas séries (e sim, eu sei que elas são meio irritantes) que precisa de um capítulo completo, que dá espaço para os personagens respirarem pela primeira vez, antes de mostrar para que veio. “Episode 2” é a magnum opus televisiva de David Fincher até hoje – o diretor lança mão de todos os seus recursos patenteados, a sua precisão lendária e sua psicologia perturbada para criar um episódio diametralmente perfeito (por vezes, até demais) que nos mostra porque Mindhunter é um dos grandes dramas da TV americana de 2017. Aqui, a série floresce como uma história sobre o espírito de inovação tanto quanto sobre os perigos dele, e a cegueira que ele pode provocar; também aqui, Mindhunter começa a nos apresentar a um elenco matador de coadjuvantes e convidados que colorem em um milhão de perigosas matizes de cinza o mundo preto e branco da investigação criminal televisiva.

14. “Dance Dance Resolution” (The Good Place 2×02)

Desde o começo de The Good Place ficou claro que a comédia da NBC não tinha medo de reinventar a própria roda, ou virar a própria mesa e jogar com as peças onde quer que elas caíssem. Em “Dance Dance Resolution”, no entanto, o criador Michael Schur e a roteirista Megan Amram superam todas as expectativas ao reescrever as regras do jogo não uma, mas várias vezes dentro de 20 minutos. The Good Place “brinca de cabra cega” com sua própria premissa, procurando obstinadamente um novo propósito ou direção, e o resultado é, pura e simplesmente, exuberante. Kristen Bell nunca brilhou tanto quanto aqui, interpretando uma Eleanor que usa e abusa de seus amplos recursos para sair da situação em que se encontra, e o diretor Drew Goddard se diverte com um episódio com mais revoluções por minuto do que parecia possível na comédia televisiva. Não é exagero dizer que The Good Place é revolucionária – e “Dance Dance Resolution” é o melhor exemplo disso.

13. “The Toll” (Ozark, 1×10)

Para uma série que caminhou com o passo elegante e venenoso de Ozark, “The Toll” é um finale surpreendentemente emotivo. Ajuda que Jason Bateman esteja na direção, demonstrando imensa habilidade e sensibilidade na hora de marcar movimentos de cena e integrar a locação à história. Ozark é tanto sobre a família Byrde quanto sobre as condições que os colocaram na região que a batiza, e o que elas dizem sobre a sociedade como um todo. Em “The Toll”, tudo isso chega a uma conclusão arrepiante enquanto o Marty de Bateman contempla as consequências de suas ações, consiga ele esticar as próprias ambições e salvar a própria vida ou não. É um episódio à flor da pele e incomum para a série, que se aproveita ao máximo de seus atores (e Laura Linney está especialmente magnífica, é claro, mas é impossível descontar os jovens Julia Garner e Charlie Tahan tampouco) e da conexão que construiu nos nove capítulos anteriores.

12. “Pure Wudder” (Manhunt: Unabomber, 1×02)

Após um primeiro capítulo obviamente bem produzido, mas em última instância apenas intrigante, Manhunt: Unabomber se encontra no segundo episódio, “Pure Wudder”, como uma análise tensa dos detalhes que nos fazem quem somos na engrenagem complexa da sociedade em que nos encontramos. Greg Yaitanes, que sempre foi um dos diretores mais subestimados e inteligentes da TV americana, encontra aqui a oportunidade de brilhar com uma construção tão precisa e estruturada quanto as observações linguísticas de seu protagonista sobre os escritos do criminoso título. Enquanto a série revela a profundidade com a qual Fitz (Sam Worthington) se envolveu com o caso em questão, também nos apresenta o homem (Paul Bettany) que o mandou para baixo desse buraco de coelho – é o golpe de mestre dos últimos minutos de “Pure Wudder”, quando finalmente vemos e ouvimos Ted Kaczynski, pouco depois de entender o quão convincente sua visão de mundo pode parecer. Manhunt vê tudo com muita clareza, do apelo ao erro da filosofia de seu biografado, e a série nunca esteve (ou estaria) mais devastadoramente correta quanto aqui.

11. “Push Comes to Shove” (Big Little Lies 1×04)

Localizado no coração da primeira temporada de Big Little Lies, o episódio “Push Comes to Shove” marca o momento mais tenso da trama – a revelação lenta do relacionamento abusivo de Celeste (Nicole Kidman) chega a um ponto de quebra inevitável em que a personagem entra em contato com anseios que enterrou por causa do marido; Madeline (Reese Witherspoon) confronta tanto sua relação com o ex-marido quanto com a filha mais velha; e Jane (Shailene Woodley) desmorona sob a pressão de pensar em seu filho como uma criança violenta. O ás na manga do episódio é Jean-Mac Vallée, mais valioso aqui do que em qualquer outro momento da série, orquestrando as múltiplas linhas de trama com a habilidade de um maestro excepcional, executando o crescendo do roteiro de David E. Kelley com precisão enquanto suas três atrizes centrais entregam o trabalho que se mostrará a fundação para a fase final da trama. É um ponto crítico para Big Little Lies, em que tudo poderia ter se deturpado por um mínimo detalhe para o terceiro ato – por causa do trabalho tênue e perfeito de todos os envolvidos, não aconteceu.

10. “Abandoned!” (Feud: Bette and Joan, 1×07)

Embora “And the Winner Is… (The Oscars of 1963)” (1×05) seja a realização técnica mais óbvia de Feud: Bette and Joan, há algo de mais profundo e menos polido em “Abandoned!”, que mostra um estágio chave na briga das duas gigantes da Hollywood antiga. No capítulo, Crawford e Davis filmam juntas o longa Com a Maldade na Alma (1964), que foi escrito para se tornar a nova parceria da dupla de O Que Aconteceu Com Baby Jane? (1962), mas acabaria sendo lançado com Olivia de Havilland no papel que era para ser de Crawford. São os últimos momentos em que as duas personagens estão em confronto direto em tela, e a série pinta o triunfo final de Davis durante as filmagens como amargo, de muitas e muitas formas. O roteiro de Jaffe Cohen e Michael Zam captura o âmago da disputa entre elas em alguns poucos diálogos e muita ironia narrativa, enquanto a diretora Helen Hunt busca (e encontra) na opulência decadente dos sets do novo filme o cenário perfeito para dar o último golpe antes de um finale que elabora os efeitos largamente sentidos da divisão entre as divas.

9. “Memphis” (This is Us 1×16)

É curioso que This is Us, uma série “de coral” por natureza, tenha se encontrado com suas maiores virtudes quando decidiu fazer um episódio contido em apenas um dos lados da trama – o de Randall (Starling K. Brown), que viaja com o pai biológico, William (Ron Cephas Jones) para a sua cidade natal de Memphis enquanto ele enfrenta os últimos estágios de um câncer devastador. Glenn Ficarra e John Requa dirigem “Memphis” como o delicado road-movie que ele é, dispensando atenção especial às cenas desvendando o passado de William, abrilhantadas por uma excepcional Amanda Warren na pele da mãe do mesmo. O episódio, assinado por Dan Fogelman, se conecta com todas as verdades mais importantes de This is Us, e todos os motivos pelos quais ela se conectou tanto com o público – é sobre as complicações e complexidades que fazem boas pessoas fazerem coisas que machucam a si mesmos e aos outros, e sobre a beleza dolorosa e difícil de aceitar dessa vida acidentada, nenhuma mais do que a do próprio William, personagem ao qual só uma série como This is Us poderia dar vida tão completa.

8. “Gag or Throttle” (Orphan Black, 5×07)

“Gag or Throttle” é o ápice da grande ópera social de Orphan Black, ainda  que seus elementos de ficção científica e estudo de personagem fossem continuar por mais três episódios depois dele. O capítulo é focado em Rachel, a clone “malvada” de Tatiana Maslany, e se dedica a construir e entender a história que a colocou no lugar onde estamos acostumados a vê-la, “liderando” uma organização que oprime mulheres como ela (literalmente). Maslany é pura maestria na forma como modula sua interpretação para compreender Rachel, e o roteiro de Renée St. Cyr retoma a energia visceral das primeiras temporadas de Orphan Black, a qual o diretor David Frazee também parece plenamente conectado – “Gag or Throttle” é chocante, sim, mas pelo envolvimento emocional tanto quanto pelos eventos surpreendentes de sua trama. Rachel, a mulher que se torna um monstro porque aprendeu, desde sempre, que monstros são livres, e ela não, se torna uma improvável anti heroína, e Orphan Black dispensa a ela a mesma empatia que guiou a série por cinco afinadas temporadas.

7. “Dream Variations” (Queen Sugar 2×16)

Após uma temporada virtualmente impecável de jornadas emocionais e visuais pelas vidas da família Bordelon e daqueles ao seu redor, Queen Sugar entregou um dos grandes finales do ano com “Dream Variations”. A diretora Kat Candler e a fotógrafa Kira Kelly juntam forças para mergulhar além da superfície ensolarada do visual da série – nesse mergulho, encontram tons que raramente vimos antes na produção de Ava DuVernay, que retorna ao roteiro para entregar algumas das cenas mais emocionalmente complexas e conclusivas da série até hoje. O confronto entre Ralph Angel e Darla é especialmente denso, espetacularmente atuado, e “Dream Variations” não tem medo de quebrar o coração dos fãs bem no capítulo de despedida da segunda temporada da série. Queen Sugar não é nada se não for desafiante, cravando os pés em um tom perfeito entre novelesco e realista, trazendo a vida personagens que raramente são vistos, que dirá ouvidos e entendidos, na nossa ficção.

6. “The Bridge” (The Handmaid’s Tale 1×09)

The Handmaid’s Tale não sofre de falta de grandes episódios. “Offred” (1×01) nos oferece um primeiro olhar impactante e espetacularmente preciso ao mundo de Gilead; “Late” (1×03) figura na maioria das listas de melhores do ano por sua elaboração cuidadosa de uma face terrível da opressão apresentada na trama; “A Woman’s Place” (1×06) faz de uma das personagens menos identificáveis da trama um ponto focal surpreendentemente envolvente. Para mim, no entanto, é “The Bridge” (1×09), o pré-season finale da série, que concentra o soco no estômago emocional mais bem aplicado – é um episódio sobre reações à opressão, mais do que qualquer outro na série, e encontra nas atitudes diversas de suas personagens centrais uma coleção de estudos de caso que aborda não de forma clínica ou removida, mas com noção do impacto que pode provocar ao mostrar mulheres abandonando a esperança ou a abraçando em momentos essenciais de suas vidas sob um regime opressivo. Como a cereja do bolo, a diretora Kate Dennis mantem a câmera incomodamente próxima e clara que já identificamos facilmente como a identidade visual da série, mas encontra mais tensão, angústia e tomadas decisivas do que qualquer outro de seus antecessores.

5. “Dyatkovo” (The Americans 5×11)

A aposta de The Americans em uma narrativa mais “quieta”, sem clímaces colocados nos momentos em que nos acostumamos a espera-los, normalmente gera dividendos em episódios como “Dyatkovo”, em que Phillip e Elizabeth se aproximam de uma mulher que foi responsável pela morte de muitos russos durante a Segunda Guerra Mundial. Essa história, que em termos de consequências práticas é totalmente separada do restante da temporada, chega em um momento oportuno temática e emocionalmente – ela serve para mostrar o pico nervoso de Phillip (Matthew Rhys), a tensão que não advém mais do relacionamento com Elizabeth (Keri Russell), e sim inteiramente do trabalho que realizam juntos, entendendo os limites um do outro; serve também para sublinhar o tema das cicatrizes da Segunda Guerra, que permeia toda a temporada e caracteriza em contraste chocante a sociedade russa à qual somos apresentados com o passar dos episódios. Quando The Americans explode, o que sobra nos cacos da narrativa é ressentimento e arrependimento, as emoções dominantes em um mundo complexo e doloroso como o nosso (e o deles).

4. “The Internet” (Room 104 1×05)

Por toda a sua inevitável irregularidade, séries de antologia como Room 104 tem o potencial de entregar alguns dos mais emocionantes e fascinantes pedaços de televisão de qualquer ano quando acertam. “The Internet” é um desses achados, desconstruindo uma premissa absurdamente simples (um jovem tenta explicar para sua mãe, ao telefone, como lhe enviar um arquivo por e-mail nos anos 1990), o capítulo tece uma teia emocional complexa, que envolve o espectador com familiaridades e um humor delicioso, deixando-o desprevenido para a reviravolta dramática que insere em seu terceiro ato (se é que podemos chamar assim). Karan Soni, o filho, e Poorna Jagannathan, a mãe, em performance exclusivamente vocal que revela mais sutilezas e momentos vibrantes do que muitas atuações em plena câmera, carregam o roteiro de Mark Duplass com classe, e o diretor estreante Doug Emmet aposta em um visual imediatamente identificável e minuciosamente pensado para nos atrair ainda mais para o universo maravilhoso desse conto rápido, mas jamais rasteiro, que reverbera com o espectador por muito tempo depois da aparição dos créditos em tela.

3. “My Name is Ruby” (The Deuce 1×08)

O drama da HBO sobre o mundo da prostituição e da pornografia nos EUA terminou a primeira temporada em uma nota quieta, porém notável, com “My Name is Ruby”, um episódio que consolidou como poucos na TV nesse ano a proposta e a sensibilidade de toda a série na qual se encaixa. David Simon e George Pelecanos construíram seu mundo nos detalhes durante a temporada, e encontraram nesses mesmos detalhes a redenção de sua visão clínica e distante do tema que abordam – “My Name is Ruby” é intensamente engajado na história de suas personagens, e entrega o final definitivo de uma delas com o soco no estômago mais inesperado e sem pretensões do ano. O mundo de The Deuce, assim como o nosso, continua girando em meio a acasos e sinas socialmente deterministas que ditam destinos e comportamentos – apesar de trágica, a vida real é apenas isso (real) na série da HBO.

2. “American Bitch” (Girls 6×03)

Festejar Lena Dunham à luz de seus comentários polêmicos defendendo um dos roteiristas da série, que foi acusado de assédio sexual, não parece certo – mas “American Bitch” prova que pessoas dúbias moralmente também podem ser criadoras espetaculares, ainda que talvez não devessem ter tanta oportunidade e liberdade para ser. O que deixa mais perplexo é que esse capítulo, o terceiro da temporada derradeira de Girls, é sobre assédio sexual, chamando um Matthew Rhys perfeitamente modulado (patético, mas assustador) para interpretar o escritor acusado de abuso que Hannah (Dunham) vai visitar após publicar um texto polêmico na internet sobre ele. “American Bitch” é tão bom quanto qualquer outro episódio de Girls em pintar as múltiplas facetas de Hannah, sua pretensão mal guiada e sua bizarra sabedoria contemporânea andando lado a lado o tempo todo enquanto ela circula e debate esse “rival” retórico poderoso. Nenhum capítulo foi mais pontual e mais teimosamente amargo em 2017.

1. “eps3.4_runtime-error.r00” (Mr. Robot 3×05)

Não houve realização mais marcante e mais colossal na televisão em 2017 do que o quinto episódio da 3ª temporada de Mr. Robot. Na semana de sua transmissão, muito furor foi feito em torno da técnica empregada pelo diretor Sam Esmail, o famigerado “unbroken shot”, em que várias tomadas longas são editadas de maneira a parecerem uma só por toda a duração do episódio (é como Birdman ou Festim Diabólico). Como feito de direção, fotografia e edição, o capítulo é mesmo inspirador, por falta de palavra melhor – mas o que o coloca no topo dessa lista é que cada elemento técnico escolhido por Esmail e sua equipe serve à narrativa, imbuindo com significado e propósito uma obra monumental de TV. A jornada angustiante de Elliot e Angela pela sede da E Corp em um dia fundamental se conecta com os temas mais profundos da temporada: tomada de responsabilidade, a teatralidade da superfície social em que transitamos, e muito mais. É tudo sem cortes, mas esse é um mero detalhe de uma peça complexa e fundamental de ficção de 2017.

Menções honrosas

O universo amplo da TV de hoje em dia significa que não conseguimos “espremer” nessa listinha todo mundo que queríamos. Eis alguns episódios que quase entraram (continuando nossa regra de não-repetição): “Hella Questions” é o capítulo mais completo, fascinante e sutil de Insecure até hoje; pesar do bafafá em torno de “The Spoils of War”, meu episódio favorito de Game of Thrones nesse ano foi “The Queen’s Justice”, que terminou com a morte de Olenna Tyrell; “Willow Lake” marcou outra morte de quebrar o coração em Mr. Mercedes com elegância e surpreendente sensibilidade; “Que Manden Los Payasos” empurrou as virtudes novelescas de Queen of The South para o seu clímax; e “Game Night” provou que Brooklyn Nine-Nine ainda tem cartas na manga ao introduzir uma narrativa de saída do armário surpreendente e maravilhosamente manejada.

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